O ano é 2020, sou uma jovem adulta e tenho sentido uma forte vontade de adotar uma criança. Crianças são bonitinhas, são engraçadinhas.. tantos amigos tem crianças e sempre que vou a casa deles, adoro brincar, fazer carinho além de dar várias risadas. Resolvi que vou adotar também!

Consegui a adoção! Que alegria! É uma menina linda.. eu coloco roupinha, dou banhinho, levo pra passear.. todos adoram ver como ela é alegre!
Os anos se passaram.. é final de 2024, preciso viajar, afinal de contas passar o natal e o réveillon em casa é um saco. Não encontro ninguém pra ficar com a minha criancinha.. eu preciso de férias, estou super estressada porque esse ano no trabalho foi muito puxado. Acho que vou deixar ela na rua.. afinal de contas, é só uma menininha e eu tirei ela da rua mesmo, ela vai saber se virar. É uma boa idéia, vou fazer isso. Depois que eu voltar eu arrumo outra.
Tenho certeza de que você está em choque nesse momento, de que você já procurou o meu nome e quer encontrar um meio de contato pra me xingar – com razão. Infelizmente, como veterinária e como pessoa, já ouvi essa história mais de uma vez, só que, ao invés da criancinha, era um gatinho ou um cachorrinho. Que não cabia na casa nova. Que não dava pra levar na viagem. Que era caro demais pra pagar pra alguém ficar enquanto viajo e como comidas caras e bebo minha cervejinha merecida.
Você certamente já ouviu essa mesma história, ou já contou uma parecida. E você deixou lá na rua, aquela rua em que tinha uma senhora que sempre cuidava dos bichos, e pensou “ela já cuida de 8, vai cuidar desse também”.

Pois é. Aqui vão os dados de A a Z que você não quis ver:
- Em 2023, foram aproximadamente 184.960 animais abandonados que conseguiram ser resgatados por ONGs. Sabe-se lá quantos não conseguiram.
- O abandono aumenta visivelmente em períodos festivos e de fim de ano, férias, etc.
- Mais de 75% dos casos de abandono ocorrem em áreas urbanas.
- Apenas 19% dos cães filhotes conseguem sobreviver após o abandono.
- A mortalidade de gatos é altíssima, podendo chegar a 90% em ambientes urbanos, em menos de 6 meses. Isso se dá pelo alto índice de doenças, ataques de seres humanos, envenenamento e atropelamento. Mas também pode ocorrer por fome e desnutrição. Gatos instintivamente caçam, mas nem sempre tem alimento.
Esses e outros tantos dados, aparecem em revistas e estudos, como:
- PMC – “High early life mortality in free-ranging dogs”
- PLOS ONE – “Abundance, survival, recruitment and effectiveness of sterilization of free-roaming dogs: A capture and recapture study in Brazil”
- Frontiers in Veterinary Science – revisão sobre mortalidade de gatos urbanos
- PMC – “A Case Study of 25 Years of Trap–Assess–Resolve (TAR)”
- Four Paws – relatório “The Harmful Consequences Caused by Pet Abandonment”
Aposto que você não ia querer saber como é precisar se virar na rua, ou que seu filho precisasse descobrir isso. Então, porque é tão “normal” fazer um animal passar por isso? É muito difícil ouvir “é só um cachorro / gato, tem instinto vai saber se virar sozinho”. Eles não sabem e muitos não conseguem.
Por isso, pense bem antes de adotar um bichinho, eles são vulneráveis, assim como as crianças. Se você não tiver certeza, não adote, não compre. Saiba que eles vão dar trabalho, eles vão destruir as coisas dentro da sua casa, eles vão fazer sujeira, mas eles nunca irão destruir o seu coração. Eles são capazes de te acompanhar na riqueza ou na pobreza, te dando a mesma alegria de festa quando você chegar em casa.

Se você é um adulto, aja como tal, seja responsável pela vida que você escolheu receber na sua casa. Cuide, ame, trate bem, mantenha-os abrigados, longe dos perigos das ruas. Nós não imaginamos o quão aflitivo é para eles viver na rua, desamparados.
Procure alguém que possa ficar com seu animalzinho enquanto você viaja, procure uma forma de levá-lo quando você se muda. Se você perdeu a condição de criar, procure alguém que possa adotar, procure uma ONG que possa pegar. Sempre tem um jeito de resolver a questão, sem precisar da crueldade de deixar na rua.
Nesse fim de ano, seja consciente! Ao adotar uma criança você se torna automaticamente responsável por ela, assim é com os animais também. Animais são como crianças que nunca crescem, são nossos eternos dependentes e são amorosos conosco, mesmo quando não merecemos (quem nunca brigou com o cachorro e o viu, minutos depois, vindo abanando o rabo como se nada tivesse acontecido?).
Você pode usar as redes sociais e sites como doghero, pets, airbnb para pesquisar sobre cuidadores que possam ficar com seu amigo de 4 patas enquanto você viaja, ou que possam prestar o serviço de catsister / dogsister, que basicamente consiste na pessoa ir até a sua casa para passar tempo e alimentar os seus pets – cada pessoa oferece as comodidades que julgam necessárias, consulte com cada profissional.
Existem também alguns abrigos que podem prestar esse serviço de abrigo temporário e, caso você realmente não possa mais ficar com o pet, por algum imprevisto desses que a vida insiste em nos apresentar, procure abrigos próximos que possam adotar seu pet, seja temporário ou permanentemente.
Espero, com este texto, ter incrustado um conhecimento do qual você jamais se esquecerá e que passará adiante!